Qual é a linha ténue entre o amor e o ódio?
Quando eu estava em Recife, vi uma mulher apanhando do marido.
Eram dois moradores de rua.
Cheguei na cena quando os policiais estavam indo embora, e escutei da boca de um dos policial "deixe ela aí, se ela gosta de apanhar o problema é dela".
Olhei então para a cena: vi que a mulher estava grávida.
No momento, fiquei desesperada. Comentei com uma pessoa que estava na rua "Não tem ninguem para tirar aquele homem dali? Ela está grávida!"
Pois então, o homem me disse a seguinte questão: O marido batia nela porque ela não deixava ele ir embora, pois não queria ter o filho sozinha.
Ela se jogava aos pés dele, implorava para ele não deixa-la sozinha.
E ele, gritava. Implorava para ir embora.
Depois ,sentava no chão e chorava.
Depois, voltava a chuta-la e amarrota-la sobre o chão.
E ela, se jogava aos pés dele.
E ele, gritava. Empurrava o seu próprio corpo contra o dela.
Parecia uma dança. Uma dança de três. Ele, ela, ele ou ela. Corpo sobre corpo. Pele sobre pele. Sangue. Dente. Cabelo. Chutes. Abraços. Gritos. Água.
Eu sentia que o homem iria engolir a mulher e o seu filho.
Colocaria aqueles dois dentro dele.
Os abrigaria e se sustentaria com eles, dentro de si próprio. Utilizaria de toda aquela carne para continuar vivo, para continuar respirando.
Se tornaria a sua mãe. Mãe, pai e homem.
Se tornaria o protegedor.
E comeria a carne daquela mulher e do seu filho sem dó nem piedade.
Comeria como proteção de sua matilha.
Comeria sabendo que o seu próprio corpo é a proteção maior que ele deve ter. E três dentro de um corpo só é uma junção facilitadora para proteger o seu bando.
Comeria como homem. Assim como sua mulher comeu o seu homem.
Assim como sua mulher possui o seu filho dentro dela.
Eu fui embora. Continuei andando em silêncio e fui para a minha casa, deixando aqueles três para trás.
Todo dia me lembro desse casal.
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